A cidade de Bhopal foi transformada, no meio desta fatídica madrugada de 3 de dezembro de 1984, em uma câmera de gás.
Considerado o maior desastre industrial da história, o vazamento de toneladas de gases altamente tóxicos sobre a cidade de Bhopal causou cerca de 20 mil mortes. Outras 150 mil pessoas ficaram prejudicadas (se dizia que os vivos invejavam os mortos, tamanho o sofrimento causado pelo gás que queimava olhos e pulmões das vítimas).
Intro
Tudo começou quando a Union Carbide (empresa que já não existe pois mudou seu nome para Dow após os eventos que descreverei aqui), resolveu construir uma fábrica de pesticidas na cidade de Bhopal na Índia. Embora não fora muito conhecida fora da Índia até então, esta é uma importante cidade com mais de 1 milhão de habitantes, o que foi conveniente para a fábrica pois há bastante gente para trabalhar. Aliás, a fábrica foi construída em um bairro residencial de Bhopal, do tipo aqui no Brasil conhecido como favelas. Ou seja, toneladas de venenos eram fabricadas ao lado das moradias.
O pesticida produzido pela Union Carbide (UC) in Bhopal era o Sevin (nome comercial do Carbaryl) , que pertence a grupo dos carbamatos. Carbamatos atuam em rotas metabólicas da acetilcolina que transmite informação entre nervos e causam a morte por paralisia, quando esta se estende até os músculos da respiração (morte por asfixia), assim como outros gases nervosos (nerve gases) como o Sarin, que foi usado no ataque ao metrô de Tóquio em 1985, ou gases inventados pelos nazistas como o zyklon B. |Aliás os gases usados na primeira guerra mundial (cloro, mostarda, fosgeno)são brincadeira de criança se comparados com os gases nervosos. Mas um dos ingredientes na receita deste pesticida era ainda mais letal: o MIC (isocianato de metila-methyl isocianate).
Reações químicas executadas na UC em Bhopal
Inicialmente o MIC era importado dos EUA . Depois o MIC passou a ser fabricado em Bhopal (de acordo com a rota acima na figura), o que causou o acúmulo da substância na fábrica, pois a venda do Sevin não passava por um bom momento. Embora houvesse a norma (pelo menos na fábrica dos EUA) para não armazenar mais de 30 tons de MIC (metade da capacidade do tanque), o tanque que explodiu em Bhopal armazenava 42 tons de MIC. Houve também a redução de manutenção de sistemas de segurança, devido a corte nas verbas. Ambas consequências da redução nas vendas do pesticida se unem de maneira catastrófica. A fábrica não pôde ser vendida devido , também , à sua tecnologia ultrapassada. Cogitaram-se alguns países de terceiro mundo pra onde ela poderia ser deslocada, incluindo o Brasil (Cubatão).
Runaway reaction
Permita-me usar aqui a expressão em inglês, que é muito informativa. Runaway quer dizer correr pra longe. E é isso que esse tipo de reação faz. Pense no filme Runaway train, de 1995, que é sobre um trem descontrolado, que não podia mais brecar….
Runaway reactions são muito perigosas na indústria química pois podem produzir explosões.
No canal do Youtube do órgão que investiga acidentes em indústrias químicas nos EU (U.S. Chemical Safety and Hazard Investigation Board | CSB) . Dentre outros vídeos com animações sobre runaway reactions, eu sugiro estes:
-Explosão em fábrica de pesticidas envolvendo MIC em 2011
-Runaway: Explosion at T2 Laboratories
Este último é um caso em que os engenheiros testaram com sucesso o processo em pequena escala mas quando passaram a um reator maior, houve problemas para remover o calor produzido.
A ideia básica é que quanto maior a temperatura, mais rápida uma reação química. Diversos processos industriais envolvem aquecimento da mistura reativa para acelerar o processo.
Para dar um exemplo da biologia, pense na febre, que é um ligeiro aumento na temperatura do organismo que aumenta a atividade das células de defesa do organismo (no sistema biológico o aumento deve ser pequeno porque as enzimas podem ser desativadas por um aumento de mais de uns poucos graus causando a parada do metabolismo).
O problema (runaway reaction) é quando lidamos com reações exotérmicas (aquelas que produzem calor) em recipientes fechados (reatores), pois o calor gerado pelas reação causa o aceleramento dela mesma, o que produz mais calor… até que a velocidade é imensa. Para completar, se gas são produzidos (como no caso do MIC) passa a ocorrer uma explosão. Lembre-se também de que o volume dos gases aumenta com a temperatura.
O Acidente
Os 2 tanques de MIC eram localizados em um bunker de concreto sob o solo. Possuíam um sistema de resfriamento, devido ao perigo do aquecimento, mas este havia sido sucateado devido a cortes de verbas na fábrica, assim como outros sistemas de segurança que descreverei a seguir.
Durante uma manutenção nas tubulações, houve o vazamento de água para um dos tanques que armazenava o MIC. MIC é extremamente reativo, ao ponto de reagir até com a água. A reação entre MIC e água é bastante exotérmica e houve uma runaway reaction causando a ebulição (fervimento) do líquido (MIC). O tanque começou a vibrar e o MIC na forma de gás começou a vazar pela chaminé. Dessa forma toneladas de MIC e outros gases tóxicos passaram a vazar sobre a cidade. Como são gases mais pesados que o ar, a nuvem letal permaneceu próxima ao chão,invadindo as casas e ruas da cidade.
-Com relação à população
-Falta de sirena - A população não foi avisada sobre a desgraça que estava se inciando.
Não houve um aviso sobre a desgraça que estava se iniciando. Uma sirene, por exemplo, poderia ter sido ativada para que as pessoas pelo menos acordassem e fechassem as janelas e portas de suas casas. Não havia nenhum plano de aviso e muito menos de evacuação da população no caso de acidente, embora muitos acidentes fatais já houvessem ocorrido dentro da fábrica e já havia jornalistas tentando comunicar a possibilidade de uma desgraça sem precedentes.
Por exemplo na cidade de Bilbao ( Espanha) que possui um grande conjunto de industrias e porto, existe um sistema de sirenas com diferentes códigos de toques para cada tipo de acidente:
- Falta de informção pública sobre os venenos produzidos na fábrica
As pessoas não sabiam quais venenos eram produzidos ao laod de suas casas. Elas não tinham as informações mais simples e básicas. Invés de fecharem as janelas, elas saíam às ruas e corriam, o que aumentava a exposição ao gás, especialmente dentro dos pulmoes devido ao esforço físico. Havia um caos nas ruas, com pessoas correndo desesperadas, tropeçando em cadávers, sobre um chão coberto por sangue e vômitos.
Além disso, não se sabia nem que o uso de um simples lenço úmido sobre a boca e nariz poderia reduzir muito à exposição aos venenos. Nem se sabia quais eram os venenos. Nem os médicos e hospitais tinham essa informação! Portanto não se sabia qual o antídoto a ser aplicado e as pessoas morriam e sofriam constinuamente.
-Sistemas de segurança da fábrica
Além da falha no sistema de resfriamento dos tanques de MIC, já descrita acima, houve outras que incluem:
1) Flare tower não funcionava. Esta torre é aquela onde se queimam os gases antes de serem despejados na atmosfera. É comum vermos diversas chamas, encima de torres metálicas (tipo chaminés), em complexos químicos com em Cubatão -SP ou refinarias de petróleo.
O MIC é um gás inflamável e portanto poderia ser queimado, o que causaria poluição mas evitaria os efeitos extremamente tóxicos do MIC .
Este sistema de segurança não fiuncionava na ocasião do acidente. De todas formas, haveria a possibilidadde de explosão durante a queima de uma quantidade tão grande de MIC (toneladas).
2) Vent Gas Scrubber não funcionava. Este é um dispositivo que lança soda cúastica sobre evetuais gases tóxicos que se dirigem às chaminés, para serem destruídos.
3) Cortina de água não funcionava – Esta devia lançar água sobre os gases antes de serem liberados na chamminé, de modo a aliviar o problema.. A altura do jato de água não alcançava o topo da chaminé.
Após o acidente a fábrica ainda foi reativada para produzir mais pesiticida, de modo a consumir o restante do MIC em outros tanques. Após isso, ela foi abandonada para sempre. O solo e a água sob a região encontram-se ainda contaminados com inúmeras substâncias tóxicas, afetando as vidas de milhares de pessoas.
As informações que usei para elaborar este texto foram obtidas em diversos websites e também outros meios. Websites incluem:
reportagem no site downtoearth.in
reportagem no site environmentalpollution.in
Além disso, estudei livros e filmes sobre a tragédia.
Filmes sobre a tragédia de Bhopal incluem: Bhopal Express (1999) Bhopal: A Prayer for Rain (2014).
Livro: A Breath of Fresh Air(2002)